Segundo a Organização Mundial da Saúde, o número de novos casos de câncer aumentará de 10 milhões, em 2000, para 15 milhões, em 2020, e 60% ocorrerão nos países em desenvolvimento. Para se ter uma idéia da magnitude desses números, trata-se de um universo de pacientes maior do que o de todas as pessoas infectadas pelo Vírus HIV nos últimos 24 anos. Para o Brasil, em 2006, estima-se a ocorrência de 470 mil novos casos. Apesar da substancial aplicação de recursos federais na assistência oncológica - aumentou cerca de 73% entre 2000 e 2004 -, os resultados alcançados estão muito longe de um patamar nem sequer aceitável. Por exemplo, é intolerável que o câncer do colo do útero - prevenível e curável - seja o segundo de maior incidência e a terceira causa de morte feminina no país.
De acordo com o Pnad/Saúde 2003, do IBGE , cerca de 69% das mulheres com mais de 25 anos de idade informaram já haver realizado exame preventivo para o câncer do colo do útero. Esse desempenho, no entanto, não produziu alteração na tendência da mortalidade, que permanece elevada. Entre as possíveis razões, deve-se considerar a falta de garantia da qualidade dos exames, a falta de acompanhamento das pacientes e a baixa capacidade de mobilização social. Os serviços de assistência oncológica de alta complexidade são ainda insuficientes mas, sobretudo, inadequados e maldistribuídos geograficamente. Pela ausência de cuidados efetivos nos outros níveis da rede de saúde, os tratamentos ocorrem em estágios muito avançados.
Que fazer? Para reduzir a mortalidade, será preciso ampliar o diagnóstico precoce, garantir acesso aos serviços, oferecer procedimentos de qualidade e profissionais bem capacitados. Mas não penas os especialistas, todos os níveis de atenção e todos os profissionais de saúde têm um grau de responsabilidade e de contribuição para esta causa.
O Brasil já possui um nível bastante sofisticado de pesquisas na área oncológica, mas carece de ousadia na incorporação dos resultados ao sistema de saúde. Também é preciso aperfeiçoar o sistema de informação, sobretudo quanto aos tipos de câncer passíveis de rastreamento, para que todos os casos possam ser acompanha dos, de forma que a abordagem correta se dê no momento adequado. As ações de prevenção e detecção precoce precisam superar dificuldades frente aos segmentos da população que, por deficiência de escolaridade e acesso à informação, se mostram refratários às recomendações médicas, tornando-se, assim, duplamente vitimizados.
Parece existir um desequilíbrio entre a dimensão do câncer e sua visibilidade e compreensão na sociedade brasileira. A exclusão desse tema da pauta cotidiana das atenções da atenção básica à saúde, sua compreensão como um desafio exclusivo de especialistas, em muito contribui para o quadro que temos urgência em transformar. Se não é cabível desconsiderar as questões biomédicas ligadas à doença, é indispensável agregar aspectos dos doentes e da sociedade. Em suma, entender o câncer como um problema de saúde pública.
As categorias de análise da saúde pública permitem o ordenamento de fatores científicos e socioeconômicos-culturais na composição de um novo paradigma, que reconheça e enfrente o câncer como um objeto complexo. Nova compreensão da atenção ao câncer possibilita e legitima a participação de novos e diferentes atores e a ampliação das iniciativas possíveis. Trata-se da construção de um método de mediação entre realidades distintas. Trata-se da construção de redes.
Nessa perspectiva, o Instituto Nacional de Câncer - órgão do Ministério da Saúde responsável pelo controle do câncer no Brasil - propõe a estruturação da Rede de Atenção Oncológica . Trata-se de novo contexto para o combate ao câncer, o de promover a integração de diferentes parceiros, governamentais e não-governamentais, na formulação e execução de saberes, ações e serviços. As iniciativas dessa rede se articulam com sub-redes que, entrelaçadas, aproximam os diferentes aspectos da atenção oncológica integral.
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