PARTICIPAÇÃO NO TRIBUNAL DO JÚRI - ESTAGIÁRIO DA PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE PAU DOS FERROS/RN-

PARTICIPAÇÃO NO TRIBUNAL DO JÚRI  - ESTAGIÁRIO DA PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE PAU DOS FERROS/RN-
A APROVAÇÃO NA SEGUNDA FASE DA OAB CONSOLIDA UM PROCESSO QUE CULMINARÁ COM A CONCLUSÃO DO CURSO EM 2015 E OPORTUNAMENTE EXERCER O EXECÍCIO DA ADVOCACIA.

quinta-feira, 21 de abril de 2011

O PLANO ANTIMISÉRIA DE DILMA


Como o governo planeja tirar 15 milhões de brasileiros da pobreza extrema adotando um pacote de investimentos sociais e programas de capacitação para o trabalho
Sérgio Pardellas e Luiza Villaméa
Nos últimos dias, a presidente Dilma Rousseff colocou integrantes de pelo menos cinco ministérios, incluindo os da área econômica, para trabalhar no programa de Erradicação da Miséria, que deve ser anunciado até a segunda quinzena de maio. As reuniões vêm acontecendo no gabinete da Casa Civil, no quarto andar do Palácio do Planalto, cercadas de sigilo. O plano é uma promessa de campanha que a presidente pretende transformar na marca de seu mandato, o que explica o clima de segredo dos trabalhos de preparação. Mas ISTOÉ obteve informações sobre o caminho que vem sendo escolhido pela equipe de Dilma. A exemplo do programa Bolsa Família, por meio do qual o governo Luiz Inácio Lula da Silva ajudou a promover a ascensão social de 28 milhões de pessoas, o beneficiário do plano antimiséria também ganhará um cartão de acesso. Com isso, se evitarão a concentração e a intermediação política na distribuição dos benefícios – terreno sempre fértil para as práticas populistas e o coronelismo. Desta vez, garante o governo, o assistencialismo é só uma das partes do programa, que prevê a retirada da miséria de até 15 milhões de brasileiros. A partir das necessidades de cada região, a presidente pretende organizar cursos de capacitação para aqueles que vivem em condições de extrema pobreza. O plano antimiséria, neste sentido, é um incentivo ao trabalho. O novo pacote incluirá ainda o programa Água para Todos, que projeta a construção de 800 mil cisternas no País.
O plano de Dilma será dirigido principalmente para um contingente de brasileiros que se concentra na região Norte, no semiárido brasileiro, e na periferia de regiões metropolitanas (leia quadro à pág. 38). Para executá-lo, o governo planeja atuar em todo o território nacional, envolvendo governos estaduais e municipais, com base em três linhas principais. A primeira delas é a ampliação do número de beneficiários do Bolsa Família, que terá um reajuste, ainda em análise, para famílias com mais filhos. A segunta intenção é levar para o mercado de trabalho uma camada da população que hoje se encontra excluída. Por fim, o governo pretende aumentar os serviços de saúde, educação, saneamento básico e habitação nas regiões mais carentes. A ideia é associar a ampliação dos benefícios sociais com o aumento das oportunidades de emprego, tanto no meio rural quanto urbano. “Vamos sobrepor o mapa da pobreza ao mapa das oportunidades”, contou um ministro de Dilma. Um levantamento da Casa Civil já constatou quais são as principais demandas do mercado de trabalho em pelo menos 75 centros urbanos. Por meio do Sistema Nacional de Empregos, o governo quer oferecer nessas regiões cursos profissionalizantes para os inscritos no programa.
O gueto das mulheresA Vila Any fica na divisa da zona leste de São Paulo com a cidade de Guarulhos. Ali, em um bolsão de miséria às margens do rio Tietê, vivem Antônia, Claudia, Maria, Suelen e Sueli (mãe do garoto da foto, Douglas, 5 anos). Em comum, essas mulheres têm mais de cinco filhos cada uma. Os maridos, todos com problemas com o álcool, saíram de casa e nunca mais voltaram. Abandonadas, elas não trabalham, pois precisam ficar com as crianças. A renda de suas famílias se limita ao benefício do Bolsa Família.
O governo tem a pretensão de criar políticas públicas que facilitem a integração desses brasileiros à sociedade, a começar pela obtenção de documentos pessoais. Em relação às mulheres, antes de mais nada será necessário aumentar o número de creches do País, para que elas tenham condição de trabalhar. Para jovens que já recebem benefícios sociais – 70% das pessoas que ganham o Bolsa Família têm até 29 anos – a intenção é criar novas vagas de emprego. O projeto de Dilma estuda também formas de atuar com jovens viciados em drogas, sobretudo o crack, cujas famílias vivem na periferia das cidades. Mas as estratégias a serem usadas não estão definidas. “As drogas não destroem apenas os jovens, mas desestruturam famílias inteiras. O plano não estará completo se não dermos uma atenção para essa questão”, tem repetido Dilma em conversas com auxiliares.
Estudos encomendados pelo governo mostraram que grande parte dos miseráveis do País não tem acesso aos benefícios oferecidos pelo Estado por absoluta falta de conhecimento, o que deve ser enfrentado com investimentos em comunicação. Profissionais serão treinados nos Estados e municípios para orientar os cidadãos situados abaixo da linha da pobreza sobre os seus direitos e como poderão ter acesso a eles. Funcionarão também como uma espécie de educadores. “É inacreditável como tem muita gente isolada, sem nenhuma informação, nas regiões metropolitanas”, disse a ministra de Desenvolvimento Social, Tereza Campello, uma das coordenadoras do programa, em recente reunião com integrantes do primeiro escalão federal.
Nas barbas do poderA apenas 500 metros do Palácio do Planalto, em Brasília, 14 famílias vivem em condições precárias, sobrevivendo do papel e das latas de alumínio que recolhem nas ruas do centro do poder. A invasão que ocupam é conhecida na capital federal como Favela da Garagem do Senado, por ficar nos fundos do estacionamento dos senadores. Cercadas por palácios e embaixadas, crianças como a da foto acima moram em abrigos improvisados, no meio de um matagal alto, por onde ratos circulam o tempo todo
Para desenvolver o programa, o governo vai estabelecer uma linha oficial de pobreza. O valor, em estudo pelo Palácio do Planalto, é de R$ 138 no que se refere à renda por pessoa. O objetivo é completar a renda daqueles que recebem menos do que este piso, o que geraria uma despesa de R$ 21,7 bilhões por ano. A linha de pobreza foi proposta pela Fundação Getulio Vargas, que possui um representante nos debates do Palácio do Planalto, o economista-chefe do Centro de Políticas Sociais, Marcelo Neri. “O custo do programa ficará menor ao longo do tempo, se o bolo continuar a crescer com mais fermento entre os mais pobres”, diz ele. O economista tem participado das reuniões na condição de consultor.
Até hoje, diversas instituições adotaram critérios distintos para medir a quantidade de miseráveis no País, futuro público-alvo das iniciativas do governo. Nenhum critério, porém, jamais havia sido adotado como oficial pelo governo. Nas reuniões do Palácio do Planalto, estima-se que essa parcela da população varia entre nove milhões e 15 milhões de pessoas. Os números ainda não estão fechados, pois a classificação não levará em conta apenas a renda, mas o acesso a serviços públicos, como o transporte e a educação. Esse mapa tem como base um cadastro ampliado do próprio Bolsa Família, enviado aos beneficiários no início do ano para atualização.
Brasileiros invisíveisConhecido como Jardim Gramacho, o maior aterro sanitário do Brasil está sempre rodeado por uma espécie de cidadãos invisíveis. São centenas de brasileiros, em geral sem registro civil nem acesso às redes públicas de educação e saúde, que não contam nem para efeito de estatística. Do lado de fora do lixão, situado na Baixada Fluminense, no Rio de Janeiro, esses catadores vivem das migalhas do lixo e consideram como elite aqueles que trabalham dentro do aterro cercado por grades de ferro
Para que os trabalhos sejam coordenados com Estados e municípios, a ministra do Desenvolvimento Social já se reuniu com vários governadores. Na segunda-feira 18, o encontro foi com o governador do Espírito Santo, Renato Casagrande (PSB). Entre outros pontos, eles discutiram a possibilidade de o governo capixaba criar um programa de transferência de renda complementar ao Bolsa Família. A sugestão deve ser levada também para outros Estados.
A equipe encarregada de elaborar o plano antimiséria vem recebendo até propostas vindas de fora do governo. Uma das mais recentes foi feita pelo presidente do conselho da pequena empresa da Federação do Comércio paulista, Paulo Feldman. Ele defende o estímulo ao empreendedorismo como uma forma de combate à miséria. Feldman lembra que seria impossível criar empregos em número suficiente para atender a todas as pessoas que passam fome. Mas com políticas de apoio ao espírito empreendedor, como o microcrédito, este espaço poderia ser preenchido. O economista lembrou as experiências da Índia, com mães que acabaram se tornando boas costureiras depois que conseguiram comprar suas primeiras máquinas por meio de microcrédito. O mesmo aconteceu com boa parte da juventude que conseguiu obter renda a partir de incentivos para compra de laptops. Em ambos os casos, coube ao Estado promover não só acesso ao crédito, mas também cursos profissionalizantes. No Brasil, os auxiliares de Dilma já fazem levantamento sobre a disponibilidade desses cursos pelos governos estaduais.
Renda zeroA pernambucana Sebastiana da Silva, 64 anos, vive e sobrevive com renda zero em uma favela na capital paulista, onde chegou há 18 anos. “Um dia me dão uma coisa aqui e outra ali. É assim que vou vivendo.” Seu casebre, de terra batida, não possui saneamento básico. “Faço as minhas necessidades em uma sacola plástica.”Seu sonho é conseguir a aposentadoria. Com o dinheiro, ela deseja ajudar a mãe de 86 anos, que ficou na terra natal. “Quero ir embora. Aqui, não tenho nada.”
No combate à pobreza o Brasil tem demonstrado avanços. Em 1990, 25,6% dos brasileiros viviam com uma renda inferior ao critério da pobreza extrema estabelecido pela ONU. Em acordo firmado na Cúpula do Milênio, o Brasil se comprometeu a reduzir este número pela metade até 2015. Em 2008, porém, o País superou essa meta. Dilma acredita que poderá ter o mesmo desempenho encarando a miséria absoluta com programas que promovam a inclusão, distribuição de renda e acesso à cidadania.


(Isto é online - 21/04/2011)

EM BUSCA DA ERRADICAÇÃO DA POBREZA

[Proposta privilegia políticas públicas que assegurem acesso a bens e serviços essenciais]
[A dicotomia entres os objetivos ético e econômico é o que mais incomoda]

Um “Programa Áureo de Erradicação da Pobreza” foi proposto por Cristovam Buarque nas páginas da revista República. “Áureo” porque exigiria um esforço social semelhante ao da abolição da escravatura, tanto no compromisso ético, quanto na vontade política. Em vez de passar pelo crescimento econômico, sua estratégia para acabar com a pobreza em quinze anos se baseia em políticas públicas que assegurem o acesso de todos aos bens e serviços essenciais. Principalmente comida, educação, saúde, transporte e moradia. “Para erradicar a pobreza, o caminho é empregar a população diretamente na produção dos bens e serviços essenciais. Criar um produtivismo social que transforme os pobres desempregados em produtores do que o Brasil precisa para erradicar a pobreza de sua sociedade.”

O programa é composto de 10 incentivos sociais diretos e 4 indiretos para que respectivamente pobres e não-pobres produzam bens e serviços essenciais. Entre os diretos está o famoso Bolsa-Escola, mas também uma licença maternidade universal e ampliada, a construção de escolas, os assentamentos, ou o micro-crédito. Os indiretos prevêem a participação da universidade e a contratação de professores e servidores para o ensino básico e fundamental. Segundo as estimativas do autor, mesmo nos anos de gastos máximos, a necessidade de desembolso real não passaria de R$ 25 bilhões. O que equivale a uns 6% da receita prevista para o setor público brasileiro e a algo em torno de 2% da renda nacional. Além disso, para começar bastariam R$ 10 bilhões no primeiro ano, dos quais R$ 4 bilhões já estão sendo usados pelo Fundo de Combate à Pobreza.

Claro, o ex-governador do Distrito Federal não chega a descartar a necessidade de o Brasil manter seu esforço de crescimento econômico. Mas considera que são coisas inteiramente diversas. A erradicação da pobreza seria o maior objetivo ético da sociedade brasileira neste momento de sua história. Muito maior que o objetivo econômico de “construir sua riqueza”. E o cumprimento do objetivo ético só poderia ajudar crescimento econômico por meio de um “keynesianismo socialmente produtivo e financeiramente equilibrado”. Em vez de esperar que o crescimento liquide a pobreza, Cristovam Buarque quer virar o jogo: é a erradicação da pobreza que deve induzir ao crescimento econômico: “um crescimento pela base”.

A dicotomia entre os objetivos ético e econômico é o que mais incomoda. Não há dúvida de que economia e ética, como campos do conhecimento, se distanciaram gravemente, gerando uma das principais deficiências da teoria econômica contemporânea. Mas tal distanciamento não autoriza a suposição de que os objetivos éticos e econômicos de uma sociedade possam ser separados no tempo. Nada mais artificial do que imaginar que uma sociedade possa adiar seus anseios econômicos para se concentrar primeiro em imperativos éticos. Em todo caso, não foi o que ocorreu no Sri Lanka, na China pré-reforma, na Costa Rica e no Estado indiano do Kerala, as quatro experiências em que se verificou substancial redução da pobreza na ausência de significativo crescimento econômico.
Foi no livro Hunger and public action (Clarendon Press, Oxford, 1989) que Jean Drèze e Amartya Sen demonstraram que além de não ser condição suficiente, o crescimento econômico não é sequer condição necessária do êxito no combate à miséria. O crescimento não é condição suficiente porque só reduz o número de miseráveis se estiver fortemente orientado para o emprego e para a expansão de serviços sociais mais relevantes, como os de saúde, educação e proteção social. O crescimento também não é condição necessária porque a expansão do emprego e dos serviços sociais mais relevantes dele não dependeu nos quatro casos citados. E a viabilidade desse processo alternativo repousa no fato dos serviços sociais relevantes serem altamente intensivos em trabalho e, portanto, relativamente baratos nas situações de mais pobreza, onde os salários são baixos. Uma economia pobre tem menos dinheiro para despender em serviços de saúde e educação, mas também precisa gastar menos para fornecer os mesmos serviços. E o aumento da renda das populações mais desfavorecidas não lhes faculta o acesso aos bens públicos essenciais, como educação básica de qualidade, atendimento eficiente de saúde e moradia com água potável, coleta de lixo e esgoto. Por mais que aumente a renda dessas famílias elas dificilmente poderão ter acesso ao ensino pago, aderir a planos de saúde, ou pagar aluguel de domicílio decente.
Ocorre, todavia, que esse processo alternativo é menos vantajoso, pois com crescimento econômico é possível combater simultaneamente outras privações mais vinculadas aos baixos níveis de renda: comer bem, locomover-se facilmente, morar e vestir-se de forma adequada, etc. Por isso, o grande desafio é conseguir orientar o crescimento simultaneamente para o emprego e para a expansão dos serviços sociais essenciais, mantendo a alternativa aberta pelo Sri Lanka, China, Costa Rica e Kerala como uma espécie de plano “B”, e não como um plano “áureo”.
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José Eli da Veiga é professor titular da FEA-USP e secretário do Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (CNDRS). www.fea.usp.br/professores/zeeli/